quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Vitor Pirralho lança novo disco, Pau Brasil


O rapper Vitor Pirralho lança seu segundo disco, Pau Brasil, e apresenta o material inédito em uma série de shows no interior de Alagoas dentro do Projeto Pixinguinha. O lançamento na capital, Maceió, acontecerá no dia 12 de setembro.

Vitor é um letrista inteligente e foge dos lugares comuns do rap, que, raras exceções, limitam-se aos temas de crítica social e racismo de forma um tanto panfletária. Já o som do grupo U.N.I.D.A.D.E. fornece a sonoridade perfeita para as rimas de Vitor, com muito balanço e arranjos ainda mais certeiros que no primeiro disco, Devoração Crítica do Legado Universal, outro petardo! Música pra dançar e pensar. “Siga Lá”!

Marcelo Cabral - Você está fazendo uma série de shows em cidades do interior de Alagoas para promover o novo trabalho dentro do Projeto Pixinguinha, como Barra de Santo Antônio e a histórica Penedo. Como tem sido essa experiência?

Vitor Pirralho - Independente do número de pessoas que compõe a platéia, a idéia de expandir o som, tocá-lo em novos lugares, mostrá-lo em outros ambientes, é o que realmente instiga o artista. Falo em platéia porque o naipe do nosso som nem sempre agrada as pessoas das cidades de interior, mas sempre agrada o interior das pessoas dessas cidades que se permitem ouvir. Ou seja, a experiência sempre é válida quando se tem oportunidade de sair de um eixo e transitar por outro. O Projeto Pixinguinha proporcionou esse trânsito e sem dúvida bons frutos serão colhidos.

MC - Pau Brasil é seu segundo trabalho com o grupo U.N.I.D.A.D.E. Como está o novo disco? Nas letras, você tem um mote principal? Um conceito? Como a Antropofagia Cultural foi o norte de Devoração Crítica do Legado Universal, seu primeiro disco.

VP - Na verdade, Marcelo, a Antropofagia é sempre o norte de quem se dispõe a digerir culturas e processá-las a sua maneira. E essa é minha disposição, sempre. O velho jeitinho gaiato brasileiro de ser, se apropriando do que interessa. Mas posso te dizer que nesse disco a Antropofagia vem de forma mais veemente. No primeiro há citações antropofágicas, no que está por vir há práticas antropofágicas. E o mote do disco, eu diria, é a evolução da colonização, que vem das grandes navegações aos grandes meios de comunicação, dos autos jesuíticos ao google. De como o branco chega ao Brasil trazendo negros subjugados à força física e da mesma maneira subjuga quem já estava aqui, os indígenas. E desse inusitado sincretismo, entre canibalismos e assassinatos, faz-se o grande carnaval que é o Brasil.

MC - Recentemente assisti na Tv Cultura o show de vocês no palco do Itaú Cultural em São Paulo. Muito bom, aliás! Como foi a recepção ao seu rap praieiro por lá?

VP - Para minha surpresa a recepção foi mais do que eu esperava. Sabia que haveria um respeito pelo som, por sua veracidade, é possível não apreciar algo, mas respeitá-lo pelo modo como se apresenta, mas na verdade houve uma assimilação, além do respeito, sabe? As pessoas curtiram, aplaudiram de pé. Foi muito bom! Acho que esse estilo praieiro, como você falou, levou outros ares, uma brisa do mar, para o cinza de São Paulo.



MC - Quais as suas impressões sobre o movimento hip-hop em Maceió? Você estabelece alguma conexão com este cenário ainda tímido aqui no estado?

VP - Há uma já batida problemática em torno desta questão. O movimento H2 em Maceió continua e, muito provavelmente, continuará tímido, como você bem colocou, se não houver uma tentativa de expansão por parte de quem faz o movimento. Se você escutar uma música de rap produzida em Maceió sem saber que ela foi feita aqui e por pessoas daqui, muito provavelmente você chegará à conclusão de que se trata de um rap paulista, entendeu? É pré-fabricado, é cópia do estilo, das gírias, até do sotaque, há uma imitação no jeito de agir. Percebe? E é aí que entra a crucial Antropofagia, eu gosto do estilo rap paulista, mas eu não o copio, eu faço proveito dele, ponho no liquidificador com o Guerreiro, com o Coco, com o Reisado, e tiro o caldo. Canto minha real. Cantar problemas sociais, como assaltos, assassinatos, violência, é necessário (e o rap é um bom instrumento de denúncia), mas tem que ser autêntico, truta! Morô? (risos) O próprio rap paulista fez uso da Antropofagia, mesmo sem saber do que se trata - mas na percepção da necessidade de fazê-lo, quando o rap gringo chega ao Brasil (SP), logo a rapaziada tratou de moldá-lo ao contexto local. Isso deve ser feito por essas paragens de cá. Antropofagiando o Oswald de Andrade: "Só a Antropofagia nos une..."

MC - Segundo disco disparado no mundo, quais as planos pro futuro próximo?

VP - Bom, a idéia que me vem é que música é harém, então tomara que ele seja bastante usado e abusado, devorado, consumido, explorado, no maior raio possível. Não faço planos para o futuro porque no meu caso não existe agenda, compromissos, turnê, distribuição nacional ou internacional do nosso disco, a não ser pela net, contratos, programas de TV ou rádio, entendeu? Sou mais um artista que produz arte pela necessidade mesmo de se expressar. Parafraseando a escritora cearense Rachel de Queiroz, que, ao ser perguntada por uma jornalista numa entrevista por que ela não abandonou a literatura se sua preferência era o jornalismo, ela genialmente responde: "Você já ficou grávida? Quando se está grávida é imperativo parir." Fazer um som pra mim é exatamente isso. O que se pode fazer é criar expectativas, essas são várias, e correr atrás para arrumar meios de transformar essas expectativas em concreto, em algo palpável. A situação dos músicos brasileiros, da maioria, não é nada glamorosa, né não Marcelo? Só quem corre é que se cansa (risos).

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